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Inovação marca cogestão do CIEDS em equipamentos públicos

Notícia
6 novembro 2020
Inovação marca cogestão do CIEDS em equipamentos públicos

Uma história em quadrinho ou um gibi têm o potencial de serem porta de entrada para o universo da leitura entre crianças e adolescentes, além de incentivarem a criatividade e a imaginação. Guilherme Nascimento, designer e ilustrador, parte da equipe de comunicação do CIEDS, é um aficionado por quadrinhos. Certo dia, resolveu fazer uma revisão da sua coleção e separou alguns para doação. Não satisfeito, identificou outras obras em seu acervo que também poderiam ser doadas. Assim, reuniu nada mais, nada menos que 276 gibis e livros para doação. Quem ganhou tamanha preciosidade foram jovens de Unidades de Reinserção Social (URS), equipamentos públicos da área de assistência social, cuja cogestão é realizada pelo CIEDS. Além disso, o entusiasta ainda se dispôs a realizar oficinas para os meninos e meninas, voltada para desenho e construção de narrativas, ideia alinhada à aposta em inovação da cogestão.

“No processo de cogestão dos equipamentos públicos, a gente sempre buscou propor dinâmicas, oficinas, capacitações, rodas de conversa, não só com os adolescentes, mas também com os funcionários. Todas as metodologias propostas sempre tiveram esse caminho de buscar mais do que só a cogestão das unidades. Quando a gente recebeu a doação do Gui, ficou imaginando o que fazer com tanto gibi. Começamos a pensar de que maneira poderíamos fazer com que o material circulasse entre todos os adolescentes. Daí veio a ideia de uma gibiteca itinerante”, conta Danuza Nascimento, Assistente Técnica de Projetos Sociais do CIEDS.

Os gibis foram então recolhidos, separados e catalogados por três voluntárias, sendo duas delas integrantes das equipes de restauração e de arquivamento da Biblioteca Nacional. Com a participação de pedagogos dos equipamentos públicos, o CIEDS elaborou uma proposta de construção de dois acervos permanentes, aos quais ainda se juntam mais de 200 livros também recolhidos por meio de doações entre os funcionários da casa.

As salas de leitura surgiram a partir do mapeamento de duas Unidades de Reinserção Social que teriam condições de receber o material e guardá-lo com o cuidado necessário. Para que as demais não ficassem sem o acesso ao acervo, em especial aos gibis, surgiu a ideia de gibiteca itinerante: duas caixas com gibis ficam por cerca de um mês em cada uma das seis unidades.

“A gente entendeu que as caixas seriam mais acessíveis, reduziriam o tempo de duração do projeto e trariam um impacto maior. Construímos e afinamos a proposta em conjunto com gestores e técnicos das unidades. A participação e o envolvimento dos educadores fortaleceu a proposta. Foi tudo muito compartilhado”, explica Danuza, que acompanhou a primeira oficina, realizada no último dia 14.

Para dar o pontapé inicial às atividades, Guilherme esteve na Casa Viva Penha pela manhã e na URS Paulo Freire, em Campo Grande, à tarde, para distribuir as duas caixas e realizar as primeiras oficinas com os jovens, numa proposta de apresentar técnicas de desenho e de construção de narrativas, para que, ao final, os jovens criassem suas próprias tirinhas. Mas o resultado foi ainda maior: uma verdadeira conexão.

“Já estava esperando ser legal, mas foi muito mais maneiro do que eu imaginava. Estava nervoso em relação ao conteúdo. Como são realidades muito diferentes, fiquei receoso se iam gostar. Mas foi muito legal. Fiquei com vontade de voltar mais vezes, porque sinto que faz falta para eles, que demonstraram muito carinho”, lembra Guilherme.

A primeira oficina, com as meninas da Casa Viva Penha, chamou atenção do ilustrador logo de cara. Apesar de poucas terem de fato participado da atividade, que era opcional, todas que estiveram presente prestaram atenção, interagiram e desenharam com Guilherme. “A troca de experiência com elas foi muito legal. Uma educadora falou que elas não param quietas por nem 10 minutos. Quando eu olhava para elas, estavam sempre olhando pra mim e ouvindo o que eu falava. Isso chamou a atenção dos educadores. Uma delas já pegou um quadrinho para ler e falou que quer ser desenhista”.

Julia Rafaela Bruce, estagiária de comunicação do CIEDS, acompanhou as atividades, para a realização de um minidocumentário sobre a iniciativa. Durante suas entrevistas, uma das meninas chamou sua atenção. “Teve um momento em que pedi para ela mostrar seu desenho e explicar. Ela simplesmente disse: ‘eu desenhei uma menina, mas ela é diferente das outras, ela se acha a menina mais feia, mas depois ela vê no espelho que é mais bonita, que ela pode transformar’ e se emocionou. Cada desenho disse muito sobre a história de cada uma e senti que elas conseguiram se expressar por meio da arte, desenhando bonecos felizes e contando histórias positivas”, avalia Julia.

A experiência da tarde, com os meninos da URS Paulo Freire, foi mais diferente, na opinião de Guilherme. “Fiquei mais nervoso. Parece realmente uma casa mesmo, no sentido de acolhimento. Tem uma piscina. Estava o maior calor e eles estavam na piscina. Pensei: ‘ninguém vai querer sair da piscina para me ouvir falar duas horas’. De repente, eles me viram chegando com os quadrinhos, saíram da piscina e se arrumaram”, conta ele.

E completa: “Fui conhecendo um pouco de cada um, quem tinha interesse por quadrinhos. Alguns estavam fazendo ou já haviam feito curso de desenho. Foi superlegal, tive interação grande e até perdemos um pouco a hora. Reforçaram isso para mim: ‘nossa, eles não levantaram nem para pedir o lanche’. Ficamos conversando, batendo papo. Teve o caso de um jovem que nunca participava de nada, de nenhuma atividade, e que foi bem tímido. A princípio negou, falou que não queria participar, mas foi o que mais desenhou, mais me mostrou resultado, mais quis aprender. Foi muito bom conhecer as histórias. Faz diferença dar uma atenção a mais, mostrar um conteúdo diferente, mostrar oportunidades. Foi muito positivo e bem surpreendente”.

“Como produto final, cada adolescente é incentivado a criar sua tirinha. Vamos fazer uma publicação, com uma ou duas tirinhas de cada uma das unidades. Essas oficinas são enriquecedoras, pois você vê uma aproximação entre jovens e as equipes que atuam com eles”, conclui Danuza.

A caixa com gibis que hoje está na Casa Viva Penha seguirá para a Casa Viva Del Castilho em novembro. Posteriormente, o material vai se juntar ao acervo permanente da Casa Viva Bangu. Já a caixa que está na URS Paulo Freire seguirá para a URS Dom Helder Câmara e termina na URS Cely Campello, na Taquara. Em todas as transições da gibiteca, Guilherme realizará uma oficina, atendendo a todos os jovens de todas as unidades.

O impacto de iniciativas como essa, especialmente quando realizada entre jovens, vai desde o incentivo à leitura até a criação de um espaço para que eles possam interagir coletivamente. A oportunidade de terem dentro da URS uma sala de leitura como a criada a partir das doações de Guilherme proporciona aos jovens conexões com realidades distintas, em contextos de doação, voluntariado e acolhimento institucional.

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Foto: Julia Rafaela Bruce